07 agosto, 2010

Tua caminhada...



Tua caminhada ainda não terminou....
A realidade te acolhe
dizendo que pela frente
o horizonte da vida necessita
de tuas palavras
e do teu silêncio.
Se amanhã sentires saudades,
lembra-te da fantasia e
sonha com tua próxima vitória.
Vitória que todas as armas do mundo
jamais conseguirão obter,
porque é uma vitória que surge da paz
e não do ressentimento.
É certo que irás encontrar situações
tempestuosas novamente,
mas haverá de ver sempre
o lado bom da chuva que cai
e não a faceta do raio que destrói.
Tu és jovem.
Atender a quem te chama é belo,
lutar por quem te rejeita
é quase chegar a perfeição.
A juventude precisa de sonhos
e se nutrir de lembranças,
assim como o leito dos rios
precisa da água que rola
e o coração necessita de afeto.
Não faças do amanhã
o sinônimo de nunca,
nem o ontem te seja o mesmo
que nunca mais.
Teus passos ficaram.
Olhes para trás...
mas vá em frente
pois há muitos que precisam
que chegues para poderem seguir-te.

CHARLES CHAPLIN

04 agosto, 2010

A VINGANÇA E A RECONCILIAÇÃO PENOSA




Eu ia andando pela Avenida Copacabana e olhava distraída edifícios, nesga de mar, pessoas, sem pensar em nada. Ainda não percebera que na verdade não estava distraída, estava era de uma atenção sem esforço, estava sendo uma coisa muito rara: livre. Via tudo, e à toa. Pouco a pouco é que fui percebendo que estava percebendo as coisas. Minha liberdade então se intensificou um pouco mais, sem deixar de ser liberdade. Não era tour de propriétaire, nada daquilo era meu, nem eu queria. Mas parece-me que me sentia satisfeita com o que via.

Tive então um sentimento de que nunca ouvi falar. Por puro carinho, eu me senti a mãe de Deus, que era a terra, o mundo. Por puro carinho, mesmo, sem nenhuma prepotência ou glória, sem o menor senso de superioridade ou igualdade eu era por carinho a mãe das coisas. Soube também, que se tudo isso “fosse mesmo” o que eu sentia, e não possivelmente um equívoco de sentimentos, que Deus sem nenhum orgulho e nenhuma pequenez se deixaria acarinhar, e sem nenhum compromisso comigo. Ser-Lhe-ia aceitável a intimidade com que eu fazia carinho. O sentimento era novo para mim, mas muito certo, e não ocorrera antes apenas porque não tinha podido ser. Sei que se ama ao que é Deus. Com amor grave, amor solene, respeito, medo e reverência. Mas nunca tinham me falado de carinho maternal. E assim como meu carinho por um filho não o reduz, até que o alarga, assim ser mãe do mundo era o meu amor apenas livre.

E foi quando quase pisei num rato morto. Em menos de um segundo estava eu eriçada pelo terror de viver, em menos de um segundo estilhaçava-me toda em pânico, e controlava como podia o meu maior profundo grito. Quase correndo, cega entre as pessoas, terminei encostada a um poste, cerrando violentamente os olhos, que não queriam mais ver. Mas a imagem colava-se às pálpebras: um rato ruivo, de cauda enorme, com os pés esmagados, e morto, quieto, ruivo.

Toda trêmula consegui continuar a viver. Toda perplexa continuei a andar, com a boca infantilizada pela surpresa. Tentei cortar a conexão entre os dois fatos: o que eu sentira minutos antes e o rato. Mas era inútil. Pelo menos a contigüidade ligava-os. Os dois fatos tinham ilogicamente um nexo. Espantava-me que um rato tivesse sido o meu contraponto. E a revolta de súbito me tomou: então não podia eu me entregar desprevenida ao amor? De que estava Deus querendo me lembrar? Não sou pessoa que precisa ser lembrava de que dentro de tudo há o sangue! Não só não esqueço o sangue de dentro como eu o admito e o quero, sou demais o sangue para esquecer o sangue, e para mim a palavra espiritual não tem sentido, e nem a palavra terreno tem sentido. Não era preciso ter jogado na minha cara tão nua um rato! Não naquele instante! Bem poderia ter sido levado em conta o pavor que desde a pré-história me alucina e me persegue, os ratos já riram de mim, no passado do mundo os ratos já me devoraram com pressa e raiva! Então era assim? Eu andando pelo mundo sem pedir nada, sem precisar de nada, amando de puro amor inocente, e Deus a me mostrar o seu rato? A grosseria de Deus me feria e insultava-me. Deus era bruto. Andando com o coração fechado, minha decepção era tão inconsolável como só em criança fui decepcionada. Eu, que em criança havia crescido depressa demais só para escapar dos abusos de minha infância. Continuei andando, procurava esquecer. Mas só me ocorria a vingança. Mas que vingança poderia eu contra um Deus Todo-Poderoso, contra um Deus que até com um rato esmagado podia me esmagar? Minha vulnerabilidade de criatura só. Na minha vontade de vingança nem ao menos eu podia encará-Lo, pois eu não sabia onde é que Ele mais estava, qual seria a coisa onde Ele mais estava e que eu, olhando com raiva essa coisa, eu O visse? No rato? Naquela janela? Nas pedras do chão? Em mim é que Ele não estava mais! Em mim é que eu não O via mais.

Então a vingança dos fracos me ocorreu: Ah, é assim? Pois então não guardarei segredo, e vou contar! Sei que é ignóbil ter entrado na intimidade de alguém, e depois contar seus segredos, mas vou contar – não conte, só por carinho não conte, guarde para você mesma as vergonhas Dele – mas vou contar, sim, vou espalhar isso que me aconteceu, dessa vez não vai ficar por isso mesmo, vou contar o que Ele fez, vou estragar sua reputação.

...mas quem sabe, foi porque o mundo também é rato, e eu tinha pensado que já estava pronta para o rato também. Porque eu me imaginava mais forte. Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que se ama. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é. É porque eu ainda não sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É também porque eu me ofendo à toa. É porque eu esqueço que quem nasceu depois fui eu. É porque talvez eu precise que me digam com brutalidade, pois sou muito teimosa. É porque sou muito possessiva e então me foi perguntado com alguma ironia se eu também queria o rato para mim. É porque só poderei ser mãe de uma árvore quando puder pegar um rato na mão. Sei que nunca poderei pegar um rato sem morrer de minha pior morte. Então, pois que eu use o magnificat que entoa às cegas sobre o que não sabe nem vê. E que eu use o formalismo que me afasta. Porque o formalismo não tem ferido a minha simplicidade, e sim o meu orgulho, pois é pelo orgulho de ter nascido que me sinto tão íntima do mundo, mas este mundo que ainda extrai de mim um grito. Porque o rato existe tanto quanto eu, e talvez nem eu nem o rato sejamos para ser vistos por nós mesmos, a distância nos iguala. Talvez eu tenha que aceitar antes de mais nada esta minha natureza que quer a morte de um rato. Talvez eu me ache delicada apenas porque não cometi os meus crimes. Só porque contive os meus crimes eu me acho de amor inocente. Talvez eu não possa olhar o rato enquanto não olhar com lividez esta minha alma que é apenas contida. Talvez eu tenha que chamar de “mundo” esse meu modo de ser um pouco de tudo. Como posso amar a grandeza do mundo se não posso amar o tamanho da minha natureza? Enquanto eu imaginar que “Deus” é bom só porque eu sou ruim, não estarei amando a nada: será apenas o meu modo de me acusar. Eu, que sem nem ao menos ter me percorrido toda, já escolhi amar o meu contrário, e ao meu contrário quero chamar de Deus. Eu, que jamais me habituarei a mim, estava querendo que o mundo não me escandalizasse. Porque eu , que de mim só consegui foi me submeter a mim mesma, pois sou tão mais inexorável do que eu, eu estava querendo me compensar de mim mesma com uma terra menos violenta que eu. Porque enquanto eu amar a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado, e o jogo de minha vida maior não se fará. Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe.


Clarice Lispector. Para não esquecer pág 105-108.

03 agosto, 2010

Ali



"Ela entrou e eu estava ali
Ou será que fui eu que ali entrei
Sem sequer pedir a menor licença?
Ela de batom caqui
Com os olhos olhava o quê? Eu não sei
Olhos de águas vindas
De outros oceanos
Ela me olhou - Quem?
Quem sabe com ela
Eu teria as tardes
Que sempre me passaram
Como imagens, como invenção!
Se eu não posso ter
Fico imaginando
Eu fico imaginando
Virá com ela que entrega
Virá, sim, assim virá que eu vi
Virá ou ela me espera
Virá, pois ela está ali
Ela amou o que estava ali
Ou será que foi dela o que eu já amei
Como os laços fixos de uma residência?
Ela: Alô!? E eu não reagi
Com os olhos olhava o que eu lembrei
Quando andava indo
Em outra direção
Ela me olhou - Vem!
Quem sabe com ela
Eu veria as tardes
Que sempre me faltaram
Como miragens, como ilusão!
Se eu não posso ver
Fico imaginando
Eu fico imaginando
Virá com ela que entrega
Virá, sim, assim virá que eu vi
Virá ou ela me espera
Virá, pois ela está ali
Ela andou e eu fiquei ali
Ou será que fui eu que dali mudei
Com uns passos mudos
De uma reticência?
Ela me olhou bem
Quem sabe com ela
Eu teria achado
O que sempre me faltava
Cores, colagens, sons, emoção!
Se eu não posso ser
Fico imaginando
Eu fico imaginando
Virá com ela que entrega
Virá, sim, assim virá que eu vi
Virá ou ela me espera
Virá, pois ela está ali"


Ali - Skank
Composição: Samuel Rosa e Nando Reis

O que o vento não conseguiu levar


"No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas que o vento não conseguiu levar: Um estribilho antigo. Um carinho no momento preciso. O folhear de um livro de poemas. O cheiro que tinha um dia o próprio vento." (Mário Quintana)



...

02 agosto, 2010

"Amanhã será tomorrow"


Há momentos na vida da gente, que a gente se pergunta por que é que as coisas são assim. São nesses momentos, que paramos para refletir sobre o real sentido das coisas... descobrindo assim as certezas e as incertezas da vida que a gente vem carregando desde de sempre. O interessante disso tudo, é que não é apenas questão de rever os principios, mas é questão de rever a sí mesmo, em quem você se tornou em como você interage com as pessoas, se perguntar por que as coisas são assim não adianta em nada se você não demonstra pra você mesmo o seu brilho, a sua força, a sua garra, o seu carisma, o seu alto astral, o seu vigor, sua juventude. Não basta apenas mostrar pra você mesmo, você deve agarrar isso com tudo, e provar pra todo mundo do que você é capaz e COMO você se dispoe a encarar seu medos e seus tropeços de cabeça erguida, de peito aberto, sem medo, sem preceitos, sem esquecer de quem você realmente é de que como você realmente gostaria de ser. É com esse pensamento que você abre as portas de você mesmo para que o seu verdadeiro EU mostre a todos quem está por dentro e abrindo essa porta, também, é que você consegue trazer pra dentro, interagir com o exterior, absorver as coisas. Nessas horas, temos que ficar atentos e criar um filtro para drenar tudo de ruim e absorvermos somente o bom, o agradavel, o doce. Se você consegue acordar todos os dias, com o brilho nos olhos, disposto a enfrentar seus medos, e dar um tapa nos inimigos, você consegue obter de você mesmo e dos outros tudo aquilo que você sonha, tudo aquilo que você quer. É a capacidade de nos apaixonarmos todos os dias é que nos faz criar asas e alçar vôo rumo a lugares mais distantes, mais bonitos. O fogo inocente dos olhos de uma criança, o brilho curioso, é o que devemos ter para conseguirmos sonhar, viver, sorrir e crescer.
E para finalizar, uma citação, essa é para todos vocês então decore:

"Amanhã será tomorrow"

Pedro Bial

01 agosto, 2010

Metade



"Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
Mas a outra metade é silêncio.
Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas
Como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimentos
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço
Que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que eu penso mas a outra metade é um vulcão.
Que o medo da solidão se afaste, e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável.
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso
Que eu me lembro ter dado na infância
Por que metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade eu não sei.
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço.
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção.
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também."


METADE - Composição: Oswaldo Montenegro