12 junho, 2012

DIGRESSÕES INCONSEQUENTES SOBRE O DIA DOS NAMORADOS




Namorado é quem também não pode, mas quer e demonstra: disfarçado-disfaçando.
Namorado é quem se encontra em cada reconciliação sabendo renascer e reviver dentro da mesma relação.
Namorado é quem acaba compreendendo porque está junto. Mesmo que pese, mesmo que doa. Mesmo que venha sendo ou tenha sido difícil.
Namorado é quem redescobre as emoções de quando namorou e as traduz num olhar diferente ou numa emoção que já não dá pra contar.
Namorado é quem provoca a outra parte como forma de se aproximar dela. É quem fere e arranha para depois beijar.
Namorado é quem suspira e se lembra como era e do que sentia no dia daquela fotografia vista anos depois.
Namorado é aquele que, mesmo incômodo quando presente, faz inexplicável falta quando ausente.
Namorado é o que fez da impossibilidade o alimento para mais amor guardado; e do amor guardado o abastecimento para o amor exercido. E do amor exercido a provisão para a estação da saudade.
Namorado é o que reclama mesmo injustamente, mas para poder ser amado à sua maneira, muito mais e melhor.
Namorado é a viúva ou o viúvo levando flores ao túmulo, num dia qualquer em que a saudade chega, sem necessidade de data especial.
Namorado é quem levou um pedaço de vida que permaneceu durando mesmo sem ter existido, porque tudo acabou.
Namorado é o que seria se tivesse sido, mas durou, ainda que por instantes, na fantasia.
Namorado é o núcleo da recordação daquela namorada que não chegou a ser. Mas viveu na beleza infinita da impossibilidade fantasiada.
Namorado é o casal idoso feito amizade.
Namorado é o marido em cada vitória sobre o tédio conjugal; é o que pára e num momento de lucidez conclui que sem ela teria sido pior.
Namorado é um pedaço de possibilidade em forma de deslumbramento. É um clima, um estado especial, uma espécie de vertigem com gosto de chegada à lua, misturado com refresco de pitanga.
Namorado é o amor que está ao lado, o possível, o adivinhado, o portador das nossas melhores expectativas; a fôrma do nosso exato modelo; o cheiro e o gosto de pele das indefiníveis atrações vindas da infância.
Namorado não é quem assim se denomina, como se namorar fosse o começo de uma escala hierárquica que depois continua com noivado e casamento. Nada disso! Namorado é o noivo, o marido, o amante, o tímido desejoso, o fiel impossibilitado, o infiel aturdido, o frustrado, o reprimido, sempre que neles se riscar o fogo da vontade e se acender o clarão da sua verdade. Namorado é o ser humano em estado de amor, pouco importa os nomes dados a ele.
Namorado, portanto, é o eterno proibido, porque é sempre aquele que ainda vai conseguir. Mesmo de quem pode. Namorado é um estado de sentir antes de qualquer encontro e de todas as suas descobertas, mesmos as impossíveis; pouco importa se ocorre entre casados, solteiros, noivos, viúvos ou namorados mesmo.
Namorado é o que viveu o sempre-depois e o nunca-exercido, de um olhar que se cruzou dizendo e adivinhando um tudo que não precisou de constatação para ser vivido.
Namorado é o que sempre acaba voltando: em carne e osso, ou 30 anos depois, sentado no trono dourado da fantasia, lembrança, amargura, saudade doce, breve recordação ou vivência nunca morta.
Namorado é tudo o que representa o melhor de cada um de nós, distribuído em mil faixas de luz. São as luzes das partes que nunca alcançamos; são as luzes das vontades que nunca satisfizemos e nunca satisfaremos; são as luzes dos sentimentos que nunca envelheceram; são as luzes dos sonhos que nunca se apagaram, porque deles nutrimos a ânsia de viver, num mundo onde os namoros são a prova de que as pessoas estão ávidas no Encontro com o que são e gostariam de trocar.
Namorado: um espelho que reflete o outro, o morador desconhecido dentro de nós. Euele. Eleeu. Eutu – Tueu – Nós.

Artur da Távola

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