Eu andava sim triste, depressivo, sem saída, sem pau, com os pulsos algemados nos braços da cadeira, chantageado pela pobreza neuroquímica a assistir televisão eternamente no escuro, nessa sala de mal-estar, nessa casa sem jardim. E quando você parava entre mim e o azul da tela, podia enxergar suas mãos na cintura, seu dedo em riste, seus lábios se abrindo e fechando fervorosos, seus dentes brancos se debatendo. Mas não conseguia ouvir seus gritos de socorro.
Eu queria dizer coisas. Sorri um pouco pra mim? Me ajude a descobrir onde dói. Se ajoelhe na minha frente e deite no meu colo, vê se meu peito ainda bate, meça minha pressão, traga um balde pra eu vomitar, tem vick-vaporub? Eu juro, tentei mexer em alguma mecha dos seus cabelos bem cuidados. Não era possível mover o queixo e dizer seu nome seguido de promessas boas, mas estava pensando em você, em como não voltar a te fazer chorar pelos cantos. Eu tentava, no duro. Em algum nível, como você dizia, escolhi essa condição, embora sem saber como reprogramar meu cérebro.
Todos nós temos períodos trôpegos de dormência, de confusão, de enlouquecimento. E a gente costuma vangloriar, invejar os loucos, queremos refletir no espelho como tal, em busca de mera absolvição. Um louco é só um covarde que não suportou sentir a dor. Admito, talvez o processo de enlouquecer seja excitante, chacoalhando sua mente sonolenta com nervura, entorpecendo, fazendo notar ainda ser possível jogar-se com muito ímpeto ao pote. Mas, uma vez louco, sempre. E para o louco, toda loucura é normal.
E eu quero mais, quero me surpreender, surpreender você. Quero voltar pra casa e plantar algum jasmim com seu cheiro. Só existe amor onde tem perfume e movimento - e seus pirulitos de framboesa distribuídos em pequenas bombonieres pela casa, e a cama que não tem tempo de se recompor, e os milkshakes de morango com cobertura de gelinhos, e os recados curtos em papel amarelo e autoadesivo. Assalto, só do sentimento residente, me mandando calar a boca e levantar as mãos para o céu. Loucuras, nunca mais. Eu voltei.
De todas as coisas que você me deu, a melhor delas certamente foi a chance de escolher, escolher você, escolher ficar contigo e atravessar com algum alívio os dias que eu quero simplesmente morrer pra não ser intimado a depor sobre o meu sumiço. Você me ensinou muitas coisas, a melhor delas, me ensinou que o amor verdadeiro sempre espera um pouco mais pelos abraços atrasados.
Foi só um susto. Um choque que você decidiu me dar pra afogar minha letargia. Pra me dar conta que livre de afeto não é viver, apenas matar o tempo. Eu me perguntava por que a gente estava perto demais e depois me questionei onde tudo se perdeu. Eu só queria perder a vontade de ligar todos os pontos de interrogação. Eu só quero você hoje. Não amanhã, não ontem, hoje. Agora. Não pra sempre - pra já.
Gabito
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