Um amigo meu, que está longe de ser um adolescente, me contou uma cena vivida por ele que beira o escândalo: ele convidou uma garota para jantar, conversaram a noite toda e, quando foi levá-la em casa, deu-lhe um beijo. Um beijo só. Depois de vê-la entrar, ele foi caminhando de volta para casa, sorrindo sozinho, apaixonado.
Isso não aconteceu 50 anos atrás, foi semana passada. Errou: ele não mora numa minúscula cidadezinha do interior, e sim num centro urbano da maior significância. Errou de novo: ele não é gay.
Um beijo. Um só. E ela ficou sem dormir a noite toda, ele ficou escrevendo poesia até amanhecer, cada um no seu quarto. Um beijo só, e ela foi trabalhar na manhã seguinte com um brilho diferente no olhar, e ele nem foi trabalhar, deu uma desculpa qualquer e foi correr no parque. Um beijo só, e eles nem trocaram telefones, mas sabem onde se achar. Sei lá se foi exatamente dessa maneira que ambos se sentiram, mas me permito divagar sobre o
dia seguinte deles. Pois só o que nos leva para o dia seguinte é essa esperança de que a vida não é tão seca como parece. Que um pequeno momento, de pura magia, pode nos comover. Que ainda é possível acreditar que uma emoção inesperada pode resgatar nossa fé: nem tudo está dominado. Um beijo só. Quanta inocência, diria alguém recém-chegado do carnaval da Bahia, onde pessoas estranhas se encontram na rua, beijam-se e depois seguem o trio elétrico em busca de outra boca. Quanta inocência, diria uma garota que beija três caras por noite nos finais de semana. Quanta inocência, diria um adulto com pressa de levar suas musas pra cama. Quanta ousadia, penso eu. Um beijo só e é o que basta para detonar uma bomba atômica: o sentimento.
Ou vai ver esse meu amigo é um mentiroso compulsivo: deu o maior amasso na mulher, levou-a para o apartamento dele, tirou a roupa dela ainda nas escadas, fez o que tinha que ser feito e boa noite, amor. No outro dia, não lembrou de nada, nem mesmo do que havia comido no jantar. Mas ele me contou uma versão inovadora dos fatos, e eu, que não gosto de histórias comuns, acreditei.
Ou vai ver esse meu amigo é um mentiroso compulsivo: deu o maior amasso na mulher, levou-a para o apartamento dele, tirou a roupa dela ainda nas escadas, fez o que tinha que ser feito e boa noite, amor. No outro dia, não lembrou de nada, nem mesmo do que havia comido no jantar. Mas ele me contou uma versão inovadora dos fatos, e eu, que não gosto de histórias comuns, acreditei.
Martha Medeiros.
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