30 junho, 2012

Sou feita de pedaços


"Sou feita de pedaços. Dentro de mim existe um grande pedaço de personalidade. Existem pedaços de inconstância, de ausência, de música, de paixão. Aqui existem pedaços de saudade, de felicidade, de carência, pedaços de sonhos. Existem pedaços encaixados, e também perdidos. Existe o quente, e o frio. Existem pedaços de sinceridade, de verdade, de realidade e de tristeza também. Existe simplicidade, e complicação. Existe o silencio, o perdão, o desejo e existe o desapego. Existe uma loucura, uma impulsividade, o perfume, uma dúvida. Mas , o amor é o maior dos pedaços. E isso me faz inteira."

Não sei a autoria :/

Eu não minto. Vai passar.


"Agora não da mesmo pra ser feliz, é impossível. Mas quem disse que a gente precisa ser sempre feliz? Isso é bobagem. Como Vinícius cantou "é melhor viver do que ser feliz". Porque, pra viver de verdade, a gente tem que quebrar a cara. Tem que tentar e não conseguir. Achar que vai dar e ver que não deu. Querer muito e não alcançar. Ter e perder. Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e dizer uma coisa terrível, mas que tem que ser dita. Tem que ter coragem de olhar no fundo dos olhos de alguém que a gente ama e ouvir uma coisa terrível, que tem que ser ouvida. A vida é incontornável. A gente perde, leva porrada, é passado pra trás, cai. Dói, ai, doi demaais. Mas passa. Está vendo essa dor que agora samba no seu peito de salto agulha? Você ainda vai olhá-la no fundo dos olhos e rir da cara dela. Juro que estou falando a verdade. Eu não minto. Vai passar."

Caio F. Abreu

29 junho, 2012

Sobre paixão, bebedeiras e telefonemas no dia seguinte.



A virgindade, perdi no banco do carro. Ou no chuveiro. Não me lembro. Sempre fui do tipo que não passa no bafômetro numa hora dessas. E nunca me importei com isso. Preciso de álcool pra aceitar o amor. Mas a Cristal, minha outra personalidade, cansada de acordar ao lado de desconhecidos perfumados de Nega Fulô, Brahma e Old Eight, sugeriu que parássemos de beber por um tempo. Ela me apresentou um profundo e coerente discurso, onde defendia a tese que ninguém liga pra gente no dia seguinte, por causa do nosso exagero etílico pelas madrugadas. Porque bebemos sem filtro. Porque beijamos sem filtro. Porque atropelamos etapas no relacionamento sem filtro. Realmente, ela não mentia. Não que eu me importasse. Não que alguma vez eu tenha chorado de domingo por que não tenho uma companhia pra levar ao cinema, mas esse tipo de coisa é importante pra ela, você entende? Algumas mulheres gostam disso. De ligar pra alguém no fim do expediente e perguntar como foi o seu dia. Como eu vinha tentando há anos, de todas as maneiras, inclusive com simpatias – a que ponto cheguei? – e barracos embriagados tomar pra mim o coração mais livre que já conheci, resolvi aceitar a sobriedade. Quem sabe o reflexo disso tudo não resolveria também a minha questão? Assim, Cristal e eu inauguramos nova fase.
O que de fato ocorreu é que ela tinha se interessado por um rapaz. Praticante de yoga, se não me engano, caseiro e educado, ou seja, nada parecido com os tipos que eu costumava recolher no fim da noite e levar pra casa, cobrindo-me de decepção pelas manhãs, ao olhar para eles esparramados em cima da minha cama. Cristal não estava apaixonada, apenas de saco cheio de não ter alguém para ouvir seus comentários enquanto assistia aos seus seriados prediletos ou pra presentear com um livro que todo mundo deveria ler. Deixei que ela ficasse mais forte. Tomasse conta de mim. Calei a boca. Tive de aturar os vestidinhos comportados e as sapatilhas românticas que ela adora usar pra fazer o estilo sou-pra-ser-levada-a-sério.
Eu suportei o cara por um mês. Sem álcool e sem sexo. Vocês, que não me conhecem, não fazem ideia do trabalho que me dá sair com alguém durante esse tempo todo. Eu costumo sumir depois do segundo encontro, que é quando os defeitos dele, todos juntos, desatam a piscar em amarelo fluorescente. Mas aguentei. Por ela, que sorria até quando o rapaz curtia uma dessas frases bobas e felizes que ela escreve nas redes sociais. Estar com ele até que nos fazia bem. De repente eu não me sentia mais vazia nos dias seguintes, quando telefonemas nunca acontecem. Era bom ouvir alguém perguntar como foi o meu dia e me trazer um bombom de vez em quando, sem parecer uma espécie de pagamento adiantado pra me levar pra cama no fim da noite.
Um mês e nada dele se convidar pra subir pro meu apartamentou ou sugerir alguma coisa mais avançada dentro do carro mesmo. Eu enlouquecida. Ela seduzida.  No décimo encontro, não sabemos se cansado de representar ou se por caminhos naturais dos relacionamentos, o rapaz subiu. E nós, eu e ela, preferimos uma taça de vinho pra relaxar. Apenas uma. Quebrávamos nossa regra. Pensei que ela devia estar mesmo gostando dele. Insegura para ser ela mesma. Ou eu mesma.
A noite passou.
O telefonema viria no dia seguinte. Mas o dia seguinte também passou. Calado. E outro. E a semana. E a outra semana. E o mês. Por trinta dias, ingenuamente, ela esperou notícias dele. E foi acumulando uma tristeza parecida com aquelas que me assombraram em épocas mais escuras da minha vida – nas tentativas de encarcerar o rapaz do coração livre. Ela não estava apaixonada, sabe? Era só cansaço da poltrona do cinema ao lado vazia. Era só vontade de abraçar sem tudo ficar estranho depois. Ou de sermos nós mesmas e termos mãos tricotadas a outras por isso. Era só esperança de que o telefone tocasse. De que comprovássemos sua tese, o porquê de silêncios dilacerantes. Aquilo que o espelho e os amigos e o tempo não revelam.  O álcool perdia a sua culpa. Cristal ganhava novas dúvidas.
Ela não espera mais o telefonema, posso garantir. Mas ainda passo noites tentando tirá-la de casa. Forçando para que ela sorria para um desconhecido como costumávamos fazer nos bons tempos. Quando ela tinha uma resposta para essas omissões. Mas ela não me ouve. Guardou impressões e mágoas no fundo de uma gaveta. Calou-se. Ela não estava apaixonada, você entende?

Priscila Nicolielo
É roteirista de TV (atualmente SBT), dramaturga e blogueira.
Escreve no http://priscilanicolielo.blospot.com/


Texto disponível em:
http://www.casalsemvergonha.com.br/2011/12/13/sobre-paixao-bebedeiras-e-telefonemas-no-dia-seguinte/

23 junho, 2012

Vamos combinar assim então.



"Vamos combinar assim então, sem medo e sem remorso. Descobri esses dias que as peças desse quebra cabeça estão todas com defeitinhos na ponta fazendo do encaixe um resultado impossível, mas eu arrumei as peças pertinho umas das outras, imaginando com carinho os lugares em que elas deveriam ficar e formou um desenho bonito por demais, apesar de tudo. Mesmo com todos os espaços faltando e de um detalhe ou outro mal formado, no fim das contas virou o quadro mais bonito da parede da minha casa. Melhor que isso, só o desenho torto que meu primo coloriu pra mim e disse que era a gente num parque, correndo com um cachorro sob um sol com olhos e sorriso. Se tudo encaixasse não seria tão bonito, vai por mim. Quem precisa de perfeição, no fim das contas? Eu posso suportar suas músicas e você aguentar assistir Beethoven - O Magnífico comigo mil vezes só porque eu amo aquele cachorro. A gente se ajeita com as nossas peças quebradas, a gente arruma os nossos defeitos, a gente conserta os problemas com sorvete e noites de estrelas sem conta. Eu confio em você pra tirar os Gremlins do quarto e proteger meus pés medrosos e mantê-los quentinhos.”
— Se falar de amor é clichê, então eu falo de Legos e Quebra-cabeças.
(Source: flor-de-papel)

22 junho, 2012

Não vejo mais o tempo.


"Não vejo mais o tempo, não o substimo,
quando o denomino de futuro
embora mal posso esperar para desvendar
o que já esteve me esperando por milênios
(...) de alguma forma a gente soube
(ou saberá)
que o tempo da espera
é o caminho de se encontrar."

Cáh Morandi

O valioso tempo dos maduros.



"O valioso tempo dos maduros.
Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam poucas, rói o caroço.Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Careço também de tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica são imaturas. Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral. As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos .Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos... Quero a essência! Minha alma tem pressa… Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana, que saiba rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora; não foge de sua mortalidade... Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade. O essencial faz a vida valer a pena. E para mim, basta o essencial!"


Mário Pinto de Andrade, Escritor e político angolano (1928-1990)

Coisa Boa



“Coisa boa é abraço forte, beijo quente e noite à dois. Andar agarradinho, mesmo que seja do ladinho, de mãos dadas ou cinturas juntas. Dançar de rosto colado, ficar calado, sentindo apenas a respiração e o bater do coração. Coisa boa é estar junto, ter alguém do lado, amar e ser amado.”


Dan Thurler

Às vezes...



"Às vezes é preciso esquecer a realidade e mergulhar em devaneios mentais para lembrar quem você realmente é. Às vezes é preciso fechar o baú empoeirado dos erros, das desavenças e do que poderia ter sido para descobrir novas partes de você. Viver é assim, mergulhar nos seus próprios medos para ter coragem, abandonar antigos costumes e gostos para conhecer seu ‘novo eu’. Vai dar medo, tremores, recaídas e vontade de voltar para a zona de conforto; mas vai ter raça, vai ter fé, vai ter amor, vai ter outra chance. Sempre tem um novo amanhã para afogar as lembranças de ontem."

Fernanda K. Ortolan

18 junho, 2012

Um café e um amor… Quentes, por favor!



"Um café e um amor… Quentes, por favor!
Sem excessos de doçura ou amargura.
Forte
Doce…
Que ambos façam meu coração acelerar.
...Que me mantenham vivo.
Um café e um amor… Quentes, por favor!
E que de nenhum deles eu sofra de vício,
Mas que de ambos,
Eu possa me dar ao luxo do hábito.
Um café e um amor… Quentes por favor!
Pra ter calma nos dias frios.
Pra dar colo
Quando as coisas estiverem por um fio.
E que eles nunca tenham gosto de ontem
Nem anseiem pelo amanhã
Que me façam feliz nesse agora,
Que me abracem pela manhã.
Amargos, suaves
Intensos, subtis
Saborosos!
E quentes.
Um café e um amor… Quente por favor!”

Caio Fernando Abreu

12 junho, 2012

Eles se amam. Todo mundo sabe mas ninguém acredita...




Eles se amam. Todo mundo sabe mas ninguém acredita. Não conseguem ficar juntos. Simples. Complexo. Quase impossivel. Ele continua vivendo sua vidinha idealizada e ela continua idealizando sua vidinha. Alguns dizem que isso jamais daria certo. Outros dizem que foram feitos um para o outro. Eles preferem não dizer nada. Preferem meias palavras e milhares de coisas não ditas. Ela quer atitudes, ele quer ela. Todas as noites ela pensa nele, e todas as manhãs ele pensa nela. E assim vão vivendo até quando a vontade de estar com o outro for maior do que os outros. Enquanto o mundo vive lá fora, dentro de cada um tem um pedaço do outro. E mesmo sorrindo por ai, cada um sabe a falta que o outro faz. Nunca mais se viram, nunca mais se tocaram e nunca mais serão os mesmos. É fácil porque os dias passam rápidos demais, é dificil porque o sentimento fica, vai ficando e permanece dentro deles. E todos os dias eles se perguntam o que fazer. E imaginam os abraços, as noites com dores nas costas esquecidas pelo primeiro sorriso do outro. E que no momento certo se reencontrem e que nada, nada seja por acaso.


Tati Bernardi


O que quero te dizer nesse dia dos namorados.



Nunca achei que fosse amar tanto detalhes que, se pertencessem a qualquer outra pessoa, eu nem repararia.
A verdade é que, com você, não existe detalhe que não importa.
Então, te digo que quero.
Quero muito mais manhãs acordando ao seu lado e fingindo acreditar nas suas promessas de “só mais cinco minutos”. Sei que eles sempre se transformam em meia hora de atraso, mas eu amo me atrasar com você.
Quero também mais do seu ar esquentando a minha nuca, mais das suas mãos habilidosas que navegam com uma perfeição que ainda me espanta entre carinho e  pegada, mais do seu corpo pesando deliciosamente em cima de mim.
Quero muito mais manhãs e  muito mais noites agarradas com você enquanto agradeço ao universo por ter ganho esse presente na vida.
Quero mais chances de tomar café do seu lado – mesmo que você sempre queira só café puro mas, aceite como quem aceita um presente, as frutas que cortei pra salada e um tostex daquele jeito que você gosta: bem moreninho por fora.
Quero muito mais da sua mão que sai do volante e vem pra minha coxa, dos seus sorrisos quando faço cafuné na sua cabeça enquanto dirige e – com certeza – muito mais viagens ouvindo que sou a copilota mais eficiente que você já teve.
Quero ouvir muito mais das suas ideias malucas e me surpreender concordando e, momentos depois, fazendo parte delas – afinal, a cada dia que passa, percebo que as pessoas que mais admiro são, de fato, os loucos.
Quero muito mais garrafas de vinho abertas e muito mais conversas daquelas que surgem depois da terceira taça.
Quero mais da sua esperança que nunca morre de que conseguirei ver o filme com você até o final. Eu sempre durmo. E você nunca desiste de me convidar para mais uma sessão.
Quero sonhar muito mais com a nossa casa na montanha – mesmo que não saibamos se estaremos juntos até consegui-la. Isso é só um detalhe. Quero compartilhar com você mais planos de nenhum filho e muitos cachorros – e perceber que você me ama inclusive por isso. Quero planejar muitos outros detalhes dela com você – a horta, o jardim, a estratégia pras galinhas viverem soltas porém seguras. Quero te ouvir falando dos seus planos tecnológicos pra ela enquanto reparo no brilho que surge nos seus olhos.
Quero mais da sua companhia na hora de inventar pratos e fazê-los acontecer. Quero mais da nossa vibração sempre que acertamos uma receita. Quero, inclusive, até mesmo mais das receitas que não dão certo mas que no final, sempre valem a pena pela experiência com você.
Quero degustar mais ainda cada centímetro do seu corpo. E poder oferecer o meu em troca. Quero descobrir mais detalhes, mais botões, mais cantinhos inexplorados. Quero te presentear com mais sensações e dispensar todas as palavras – quero ler mais os seus sinais.
Quero, acima de tudo, mais dessa leveza que eu só senti com você – que consigamos carregá-la e provar para nós mesmos que ela não é tão insustentável assim como as pessoas dizem. Quero que sigamos aprendendo diariamente que nada é eterno e que a felicidade está no trajeto, não só no destino. E que não importa o que acontecer nessa estrada louca da vida, que possamos trazer dentro da gente a certeza de termos vivido um amor sincero e de termos tido a dávida de descobrir qual a sensação de entregar seu coração na mão de outra pessoa – com a certeza de que ele está sendo bem cuidado como nunca. E que, não importa o que aconteça, que você nunca deixe de lembrar de mim quando afagar um cachorro ou quando tomar uma Guinness. E que você jamais esqueça de como conseguimos provar pra gente mesmo que parcerias são infinitamente melhores que namoros. E, por fim, que a felicidade seja sempre a sua melhor parceira, mesmo que eu não possa estar junto pra aplaudir essa união.

por Jaque Barbosa
Disponível em: http://www.casalsemvergonha.com.br/2012/06/12/o-que-eu-quero-te-dizer-nesse-dia-dos-namorados/


DIGRESSÕES INCONSEQUENTES SOBRE O DIA DOS NAMORADOS




Namorado é quem também não pode, mas quer e demonstra: disfarçado-disfaçando.
Namorado é quem se encontra em cada reconciliação sabendo renascer e reviver dentro da mesma relação.
Namorado é quem acaba compreendendo porque está junto. Mesmo que pese, mesmo que doa. Mesmo que venha sendo ou tenha sido difícil.
Namorado é quem redescobre as emoções de quando namorou e as traduz num olhar diferente ou numa emoção que já não dá pra contar.
Namorado é quem provoca a outra parte como forma de se aproximar dela. É quem fere e arranha para depois beijar.
Namorado é quem suspira e se lembra como era e do que sentia no dia daquela fotografia vista anos depois.
Namorado é aquele que, mesmo incômodo quando presente, faz inexplicável falta quando ausente.
Namorado é o que fez da impossibilidade o alimento para mais amor guardado; e do amor guardado o abastecimento para o amor exercido. E do amor exercido a provisão para a estação da saudade.
Namorado é o que reclama mesmo injustamente, mas para poder ser amado à sua maneira, muito mais e melhor.
Namorado é a viúva ou o viúvo levando flores ao túmulo, num dia qualquer em que a saudade chega, sem necessidade de data especial.
Namorado é quem levou um pedaço de vida que permaneceu durando mesmo sem ter existido, porque tudo acabou.
Namorado é o que seria se tivesse sido, mas durou, ainda que por instantes, na fantasia.
Namorado é o núcleo da recordação daquela namorada que não chegou a ser. Mas viveu na beleza infinita da impossibilidade fantasiada.
Namorado é o casal idoso feito amizade.
Namorado é o marido em cada vitória sobre o tédio conjugal; é o que pára e num momento de lucidez conclui que sem ela teria sido pior.
Namorado é um pedaço de possibilidade em forma de deslumbramento. É um clima, um estado especial, uma espécie de vertigem com gosto de chegada à lua, misturado com refresco de pitanga.
Namorado é o amor que está ao lado, o possível, o adivinhado, o portador das nossas melhores expectativas; a fôrma do nosso exato modelo; o cheiro e o gosto de pele das indefiníveis atrações vindas da infância.
Namorado não é quem assim se denomina, como se namorar fosse o começo de uma escala hierárquica que depois continua com noivado e casamento. Nada disso! Namorado é o noivo, o marido, o amante, o tímido desejoso, o fiel impossibilitado, o infiel aturdido, o frustrado, o reprimido, sempre que neles se riscar o fogo da vontade e se acender o clarão da sua verdade. Namorado é o ser humano em estado de amor, pouco importa os nomes dados a ele.
Namorado, portanto, é o eterno proibido, porque é sempre aquele que ainda vai conseguir. Mesmo de quem pode. Namorado é um estado de sentir antes de qualquer encontro e de todas as suas descobertas, mesmos as impossíveis; pouco importa se ocorre entre casados, solteiros, noivos, viúvos ou namorados mesmo.
Namorado é o que viveu o sempre-depois e o nunca-exercido, de um olhar que se cruzou dizendo e adivinhando um tudo que não precisou de constatação para ser vivido.
Namorado é o que sempre acaba voltando: em carne e osso, ou 30 anos depois, sentado no trono dourado da fantasia, lembrança, amargura, saudade doce, breve recordação ou vivência nunca morta.
Namorado é tudo o que representa o melhor de cada um de nós, distribuído em mil faixas de luz. São as luzes das partes que nunca alcançamos; são as luzes das vontades que nunca satisfizemos e nunca satisfaremos; são as luzes dos sentimentos que nunca envelheceram; são as luzes dos sonhos que nunca se apagaram, porque deles nutrimos a ânsia de viver, num mundo onde os namoros são a prova de que as pessoas estão ávidas no Encontro com o que são e gostariam de trocar.
Namorado: um espelho que reflete o outro, o morador desconhecido dentro de nós. Euele. Eleeu. Eutu – Tueu – Nós.

Artur da Távola

Apaixonite Aguda



"Quando estou longe, quero ficar perto
Quando estou perto, quero ficar dentro
Quando estou dentro, quero ficar mudo
Quando estou mudo, Quero dizer tudo."


Itamar Assumpção

07 junho, 2012



‎"Eu vou me acumulando, me acumulando, me acumulando - até que não caibo em mim e estouro em palavras."

Clarice Lispector

Eu gosto de carinho violento.

Eu gosto de carinho violento. De falar. De estar certa.
De quem entende o que eu digo. De quem escuta o que eu penso.
Da minha prole. Dos meus discos. Dos meus livros.
Dos meus cachorros. Dos Stones. Do Rock Natural.
Da minha solidãozinha. Dos meus blues. Do meu sofá vermelho.
Da minha casa. Do meu umbigo. De unhas cor de carmim.
De homem que sabe ser homem. De noites em claro e dias em branco. De chuva e de sol.
Eu guardo as minhas rejeições em vidrinhos rotulados com o nome deles.
Eu sou mole demais por dentro pra deixar todo mundo ver.
Eu deixo pra quem eu acho que pode comigo.
Ninguém sabe.
Mas eu tenho coração de moça.

Fernanda Young

05 junho, 2012

O que tem de ser, tem muita força...



O que tem de ser, tem muita força. Ninguém precisa se assustar com a distância, os afastamentos que acontecem. Tudo volta! E voltam mais bonitas, mais maduras, voltam quando tem de voltar, voltam quando é pra ser. Acontece que entre o ainda-não-é-hora e nossa-hora-chegou, muita gente se perde. Não se perca, viu?

Caio F. Abreu

04 junho, 2012

A descoberta do mundo



O que eu quero contar é tão delicado é tão delicado quanto a própria vida. E eu queria poder usar delicadeza que também tenho em mim, ao lado da grossura de camponesa que é o que me salva. 
Quando criança, e depois adolescente, fui precoce em muitas coisas. Em sentir um ambiente, por exemplo, em aprender a atmosfera íntima de uma pessoa. Por outro lado, longe de precoce , estava em incrível atraso em relação a outras coisas importantes. Continuo aliás atrasada em muitos terrenos. Nada posso fazer: parece que há em mim um lado infantil que não cresce jamais.
Até mais que treze anos, por exemplo, eu estava em atraso quanto ao que os americanos chamam de fatos da vida. Essa expressão se refere à relação profunda de amor entre um homem e uma mulher, da qual nascem os filhos. Ou será que eu adivinhava mas turvava minha possibilidade de lucidez para poder, sem me escandalizar comigo mesmo, continuar em inocência a me enfeitar para os meninos? Enfeitar-me aos onze anos de idade consistia em lavar o rosto tantas vezes até que a pele esticada brilhasse. Eu me sentia pronta, então. Seria minha ignorância um modo sonso e inconsciente de me manter ingênua para poder continuar, sem culpa, a pensar nos meninos? Acredito que sim. Porque eu sempre soube coisas que nem eu mesma sei que sei.
As minhas colegas de ginásio sabiam de tudo e inclusive contavam anedotas a respeito. Eu não entendia mas fingia compreender para que elas não me desprezassem e à minha ignorância.

Enquanto isso, sem saber da realidade, continuava por puro instinto a flertar com os meninos que me agradavam, a pensar neles. Meu instinto precedera a minha inteligência.
Até que um dia, já passados os treze anos, como se só então eu me sentisse madura para receber alguma realidade que me chocasse, contei a uma amiga íntima o meu segredo: que eu era ignorante e fingira de sabida. Ela mal acreditou, tão bem eu havia fingido. Mas terminou sentindo minha sinceridade e ela própria encarregou-se ali mesmo na esquina de me esclarecer o mistério da vida. Só que também ela era um amenina e não soube falar de um modo que não ferisse a minha sensibilidade de então. Fiquei paralisada olhando para ela, misturando perplexidade, terror, indignação, inocência mortalmente ferida. Mentalmente eu gaguejava: mas por quê? Mas por quê? O choque foi tão grande – e por uns meses traumatizante – que ali mesmo na esquina jurei alto que nunca iria me casar.
Embora meses depois esquecesse o juramento e continuasse com meus pequenos namoros.
Depois, com o decorrer de mais tempo, em vez de me sentir escandalizada pelo modo como uma mulher e um homem se unem, passei a achar esse modo de uma grande perfeição. E também de grande delicadeza.
Já então eu me transformara numa mocinha alta, pensativa, rebelde, tudo misturado a bastante selvageria e muita timidez.
Antes de me reconciliar com o processo da vida, no entanto, sofri muito, o que poderia ter sido evitado se um adulto responsável se tivesse encarregado de me contar como era o amo. Esse adulto saberia como lidar com uma alma infantil sem martirizá-la com a surpresa, sem obrigá-la a ter toda sozinha que se refazer para de novo aceitar a vida e os seus mistérios.
Porque o mais surpreendente é que, mesmo depois de saber de tudo, o mistério continua intacto. Embora eu saiba que de uma planta brotar um flor, continuo surpreendida com os caminhos secretos da natureza. E se continuo até hoje com pudor não é porque ache vergonhoso, é pudor apenas feminino.
Pois juro que a vida é bonita.

Clarice Lispector

03 junho, 2012

Desejo...

"Desejo que o seu melhor sorriso, esse aí tão lindo,
aconteça incontáveis vezes pelo caminho.
Que cada um deles crie mais espaço em você.
Que cada um deles cure um pouco mais o que ainda lhe dói.
Que cada um deles cante uma luz que,
mesmo que ninguém perceba,
amacie um bocadinho as durezas do mundo."

Ana Jácomo

A vida pode ser mais leve.

 
A vida pode ser mais leve.
Mais lúdica.
Se eu não brincasse, enlouqueceria.
Não posso nem sei ser essa imagem que tanta gente
congelou a respeito do que é ser adulto.
Passo longe desse freezer.
Quero o calor da vida.
Quero o sonho e a realidade melhor que ele puder gerar.
Quero alguma inocência que não seja maculada.
Quero descobrir coisas que não suspeito existirem e,
que para minha surpresa,
têm significado para o meu coração.
Adulta, quero caminhar de mãos dadas,
vida afora, com a criança que me habita:
curiosa, arteira, espontânea.

Ana Jácomo

02 junho, 2012

Eu apenas queria que você soubesse


Eu apenas queria que você soubesse
Que aquela alegria ainda está comigo
E que a minha ternura não ficou na estrada
Não ficou no tempo presa na poeira
Eu apenas queria que você soubesse
Que esta menina hoje é uma mulher
E que esta mulher é uma menina
Que colheu seu fruto flor do seu carinho
Eu apenas queria dizer a todo mundo que me gosta
Que hoje eu me gosto muito mais
Porque me entendo muito mais também
E que a atitude de recomeçar é todo dia toda hora
É se respeitar na sua força e fé
E se olhar bem fundo até o dedão do pé
Eu apenas queira que você soubesse
Que essa criança brinca nesta roda
E não teme o corte de novas feridas
Pois tem a saúde que aprendeu com a vida


Gonzaguinha

Não canse quem te quer bem


Foi durante o programa Saia Justa que a atriz Camila Morgado, discutindo sobre a chatice dos outros (e a nossa própria), lançou a frase: “Não canse quem te quer bem”. Diz ela que ouviu isso em algum lugar, mas enquanto não consegue lembrar a fonte, dou a ela a posse provisória desse achado.
Não canse quem te quer bem. Ah, se conseguíssemos manter sob controle nosso ímpeto de apoquentar. Mas não. Uns mais, outros menos, todos passam do limite na arte de encher os tubos. Ou contando uma história que não acaba nunca, ou pior: contando uma história que não acaba nunca cujos protagonistas ninguém jamais ouviu falar. Deveria ser crime inafiançável ficar contando longos casos sobre gente que não conhecemos e por quem não temos o menor interesse. Se for história de doença, então, cadeira elétrica.

Não canse quem te quer bem. Evite repetir sempre a mesma queixa. Desabafar com amigos, ok. Pedir conselho, ok também, é uma demonstração de carinho e confiança. Agora, ficar anos alugando os ouvidos alheios com as mesmas reclamações, dá licença. Troque o disco. Seus amigos gostam tanto de você, merecem saber que você é capaz de diversificar suas lamúrias.

Não canse quem te quer bem. Garçons foram treinados para te querer bem. Então não peça para trocar todos os ingredientes do risoto que você solicitou – escolha uma pizza e fim.

Seu namorado te quer muito bem. Não o obrigue a esperar pelos 20 vestidos que você vai experimentar antes de sair – pense antes no que vai usar. E discutir a relação, só uma vez por ano, se não houver outra saída.

Sua namorada também te quer muito bem. Não a amole pedindo para ela explicar de onde conhece aquele rapaz que cumprimentou na saída do cinema. Ciúme toda hora, por qualquer bobagem, é esgotante.

Não canse quem te quer bem. Não peça dinheiro emprestado pra quem vai ficar constrangido em negar. Não exija uma dedicatória especial só porque você é parente do autor do livro. E não exagere ao mostrar fotografias. Se o local que você visitou é realmente incrível, mostre três, quatro no máximo. Na verdade, fotografia a gente só mostra pra mãe e para aqueles que também aparecem na foto.

Não canse quem te quer bem. Não faça seus filhos demonstrarem dotes artísticos (cantar, dançar, tocar violão) na frente das visitas. Por amor a eles e pelas visitas.

Implicâncias quase sempre são demonstrações de afeto. Você não implica com quem te esnoba, apenas com quem possui laços fraternos. Se um amigo é barrigudo, será sobre a barriga dele que faremos piada. Se temos uma amiga que sempre chega atrasada, o atraso dela será brindado com sarcasmo. Se nosso filho é cabeludo, “quando é que tu vai cortar esse cabelo, garoto?” será a pergunta que faremos de segunda a domingo. Implicar é uma maneira de confirmar a intimidade. Mas os íntimos poderiam se elogiar, pra variar.

Não canse quem te quer bem. Se não consegue resistir a dar uma chateada, seja mala com pessoas que não te conhecem. Só esses poderão se afastar, cortar o assunto, te dar um chega pra lá. Quem te quer bem vai te ouvir até o fim e ainda vai fazer de conta que está se divertindo. Coitado. Prive-o desse infortúnio. Ele não tem culpa de gostar de você.


Martha Medeiros